segunda-feira, 31 de outubro de 2011

A GUERRA EM DUAS RODAS


Código de Trânsito precisa mudar, dizem especialistas. Lei permite imprudências que culminam em mortes em acidentes com motos, tema de reportagem de ZH - zero hora 31/10/2011


O desafio de estancar as mortes envolvendo motos, para especialistas em trânsito e transportes, passa necessariamente por uma mudança no Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Instituído em 1997 pela Lei 9.503, o documento é omisso em um ponto fundamental, que torna ainda mais vulneráveis as condições de quem se locomove sobre duas rodas.

Na edição dominical, Zero Hora apresentou um levantamento de casos em outubro, que somou 39 vidas perdidas entre condutores e caroneiros – número superior à média mensal, que foi de 34 casos até setembro de 2011.

Os índices de acidentes do tipo, de acordo com a doutora em segurança viária Christine Nodari, sempre foram altos. A diferença é que, agora, com o salto na frota, o problema está mais visível – e impactante. Por trás disso, na opinião da pesquisadora do Laboratório de Sistemas de Transporte (Lastran) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), está uma falha na legislação.

– Há uma brecha no CTB que permite aos motociclistas circularem livremente por corredores virtuais, isto é, entre os carros e os ônibus – afirma Christine.

Com isso, a moto se tornou uma alternativa bastante atraente por ser muito mais rápida e ágil no trânsito sufocado. Essa característica, aliada ao bom momento da economia, a preços acessíveis e a facilidades de pagamento, fez com que muita gente – especialmente das classes C e D – optasse pelo transporte em duas rodas, inchando a frota.

A solução para o impasse envolveria a alteração do CTB. Da forma como está redigido, o documento não permite, mas também não proíbe a circulação de motos nos chamados corredores virtuais. Se os motociclistas fossem obrigados a permanecer atrás dos outros veículos, os riscos seriam menores, e também as vantagens de se investir nesse tipo de transporte.

Só isso, porém, não seria suficiente para mudar radicalmente o cenário trágico observado hoje. Em busca de respostas para o problema, a coordenadora do curso Tecnólogo em Transportes Terrestres da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Raquel da Fonseca Holz, foi a São Paulo. Objetivo: examinar de perto as duas faixas segregadas para motocicletas na cidade.

– Percebi que elas nem sempre eram respeitadas, não só pelos motociclistas, mas principalmente pelos outros veículos, e vi que propiciavam acidentes mais impactantes entre as próprias motos e também com pedestres – revela Raquel.

Para a pesquisadora, que desenvolve um doutorado sobre o tema na UFRGS, a solução seria mais ampla:

– Além da alteração no Código de Trânsito Brasileiro, precisaria haver mais investimentos em educação e em cursos de direção defensiva, maior rigor no processo de habilitação, reforço na fiscalização e mais respeito entre os usuários. Sem isso, será difícil mudar a realidade.

É uma epidemia, destaca ministro

Além das perdas instantâneas de vidas nas ruas e estradas, os acidentes levam uma legião de feridos para hospitais. Segundo dados divulgados pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, das 145 mil internações hospitalares resultantes de acidentes de trânsito, em 2010, metade refere-se a lesões com motos.

Padilha trata o assunto como epidemia. Na semana passada, em Curitiba, o ministro chegou a propor a restrição da venda de motos a quem tem habilitação específica para o veículo. Depois, em entrevista à Rádio Gaúcha, preferiu destacar a necessidade de maior rigor na fiscalização pelo uso do capacete e do porte da carteira de habilitação.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O Ministro deveria olhar melhor para os indicadores, especialmente este mostrado na ilustração. A maioria das vítimas usava capacete e tinha CNH. Na minha opinião, é necessário atentar para os seguintes fatores:

- O capacete dentro da cidade é o maior vilão. Apesar do capacete proteger o crânio de um acidente, este equipamento reduz os sentidos e a atenção do condutor da moto. Precisa ser estudado e determinado um outro tipo de capacete que aumente o raio de visão e não diminua o sentido da visão e da audição.

- Os cursos para habilitação de motos precisam ser mais rigorosos e técnicos, preparando o condutor para as várias situações de trânsito;

- As cidades necessitam criar vias especiais para o trânsito de moto para impedir que os condutores destes veículos fiquem surfando entre os demais veículos.

- A retirada das forças policiais do trânsito reduziu a força preventiva e de contenção nas ruas das cidades, os parcos efetivos das polícias rodoviárias, e a falta de investimento no policiamento preventivo com motos (mais ágil e mais barato) nas rodovias estaduais e federais aumenta a sensação de impunidade no trânsito, acrescido pela morosidade e benevolências da justiça nos crimes de trânsito.

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