Régis de Oliveira Montenegro Barbosa, juiz de direito - ZERO HORA 20/01/2012
Em se tratando de delito de trânsito, não podemos nos deixar seduzir pelos discursos prontos, sendo imperativo distinguir o “dolo eventual” da “culpa consciente”. Aquele verifica-se quando o autor do fato, ainda que prevendo o resultado, a ele adere ou se mostra indiferente, pouco importando venha ou não a ocorrer, por isso que se fala em “assumir o risco”. Já na culpa consciente, a possibilidade da produção do evento danoso é prevista pelo agente, só que este acredita que não vá ocorrer, não o desejando. A fronteira é tênue, mas há de ser respeitada, sob pena de exageros e injustiças. Ora, o só fato de ingerir bebida alcoólica antes de dirigir não implica, necessariamente, “assumir” o efeito funesto que dele possa advir.
O recente e desditoso episódio protagonizado pela “modelo” na Estrada do Mar é emblemático neste aspecto, mesmo na ausência de habilitação para dirigir. É intuitivo que, salvo raríssimas exceções, ninguém deseja, deliberadamente, se envolver em acidente de trânsito, do qual poderá resultar graves ferimentos ou a própria morte.
Perceptível a “onda” de rigorismo a grassar nos meios de comunicação, moldando a mentalidade coletiva, fruto da concepção que vê na cadeia uma espécie de redenção para os males do mundo. Cabe um parêntese: prisão antes da sentença condenatória ao final do processo penal vem chancelada em nosso ordenamento jurídico em apertadas hipóteses, exaustivamente contempladas, não guardando função punitiva. É provisória e de natureza cautelar.
Não olvidemos que a decantada “comoção social” que alguns acidentes de trânsito ocasionam está crivada de “emocionalismo” e imantada por uma visão leiga. A menos que se altere o Código de Processo Penal ou se faça “letra morta” do princípio constitucional da inocência, que tem por escopo proporcionar segurança jurídica, na ausência do qual ficamos sujeitos a punição prévia e sem ampla possibilidade de defesa.
Uma das alternativas aponta para o agravamento da sanção prevista para crimes culposos de trânsito, dentre os quais radica a culpa consciente, a qual se traduz em 90% dos casos em que se está a bradar, irrefletidamente, que houve a assunção do resultado ou do risco de produzi-lo pelo causador do fato. A não ser que se dispense tratamento igualitário entre o infrator de trânsito e o criminoso comum, o que, não sem algum perigo, parece estar a ocorrer!
Só para não deixar passar: que se retirem os sinais indicativos de detectores de velocidade, mas, então, que sejam aumentados os incompatíveis e quase fictícios limites “máximos” nas vias e estradas, os quais duvido que até as autoridades de trânsito e os arautos do “politicamente correto” invariavelmente obedeçam!
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