quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

GASTOS COM VÍTIMAS DE ACIDENTES SOBEM 45%


No ano passado, Ministério da Saúde desembolsou R$ 211 milhões com internações

JULIANA CASTRO E LETÍCIA LINS 
O GLOBO
Atualizado:1/12/13 - 16h06


Internado em Recife: Wilson Carvalho, de 16 anos, teve fraturas na bacia e na perna O Globo / Hans von Manteuffel


RIO e RECIFE — O Ministério da Saúde tem desembolsado mais recursos para atender pessoas feridas em acidentes de de trânsito. Aumentaram as internações e o custo por elas, de acordo com os dados da pasta. Em 2012, o custo por 159.251 internações chegou a R$ 211 milhões. Já em 2003, foram gastos R$ 144,8 milhões com 109.696 internações em consequência das colisões. Esse último valor já está corrigido pela inflação do período, para permitir a comparação.

Entre janeiro e agosto deste ano, 102.146 pessoas foram parar no hospital por conta de acidentes de trânsito, o que significa um crescimento de 78% em relação ao mesmo período de 2003. O Ministério da Saúde informou que lançou uma estratégia para melhorar o atendimento de vítimas de causas externas, que incluem os acidentes de trânsito. Este ano, a pasta criou a Linha de Cuidado do Trauma na Rede de Atenção às Urgências e Emergências do Sistema Único de Saúde (SUS) e definiu um incremento de 80% a mais para pagamento de serviços referentes a 148 procedimentos.

Diante do aumento de acidentes, a pasta estabeleceu regras para habilitação de centros especializados em trauma, com o objetivo de organizar a rede hospitalar, padronizar e agilizar o atendimento às vítimas de violências e acidentes em geral e, com isso, evitar óbitos, complicações e sequelas graves.

O médico João da Veiga preside o Comitê de Prevenção aos Acidentes de Moto em Pernambuco, instituído em 2011, quando o problema começou a se agravar no estado, onde a frota de motos evoluiu 337% entre 2003 e setembro deste ano. Segundo ele, hoje, o primeiro lugar de internação nos setores de trauma é o acidentado de moto.

— A julgar pelo Hospital da Restauração, em Recife, que acompanhei de perto por muito tempo, o impacto não só no Ministério da Saúde como na própria Previdência é grande. Normalmente, esses pacientes estão em idade laboral, passam em média 45 dias internados, necessitam de no mínimo duas cirurgias e ficam até seis meses sem trabalhar. Quando deixam o hospital, 11% se aposentam devido a amputações ou desfuncionalização dos membros — afirma Veiga.

Em Recife, os traumas causados por motocicletas eram a quarta causa de internação nas emergências da capital pernambucana até o final da década passada. Agora, já respondem pela ocupação de 90% dos leitos de alta complexidade nas áreas de traumatologia e neurocirurgia dos quatro maiores hospitais públicos da cidade.

Antes, a liderança pertencia às armas de fogo, atropelamentos e colisões. Os óbitos em transportes terrestres já somam 41,2% do total registrado em Pernambuco. Só este ano, já foram 591 mortes, sendo 23 de crianças.

Wilson da Silva Carvalho, de 16 anos, pilota desde menino motos no município sertanejo de Manari, a 372 quilômetros de Recife. No dia 3 de outubro, ele trafegava por uma rodovia federal, quando bateu em um caminhão, que fugiu sem prestar socorro. Wilson foi levado para o setor de traumas do Hospital da Restauração, a maior emergência da capital. Teve fraturas na bacia e na perna.

— De moto, não quero saber nunca mais na vida — disse o estudante, que ganhava dinheiro consertando motos.

Pernambuco criou regras para tentar diminuir número de colisões

Segundo levantamento feito pelo Comitê de Prevenção aos Acidentes de Moto em Pernambuco, em 22 hospitais públicos e unidades de pronto atendimento do estado — as chamadas unidades sentinelas — 25.176 pessoas foram atendidas como vítimas de acidentes com transportes terrestres entre janeiro e agosto deste ano. Destas, 72% viajavam em motos.

O problema é ainda maior entre aqueles que usam a moto para trabalhar diariamente. Isso levou o estado a impor algumas regras, como a obrigação do uso de placa vermelha nas motos usadas para o trabalho (caso, por exemplo, de entregadores) e a exigir o uso de equipamentos de proteção, como capacete, cotoveleiras, joelheiras, botas e coletes refletivos. Os efeitos já começaram a surtir, com queda de 46% na entrada de pacientes graves nos hospitais, segundo informações do presidente do comitê, João da Veiga.

Outra medida, segundo ele, que começa a dar resultados positivos é a aplicação da Lei Seca, com blitzes permanentes. O número de óbitos em consequência de acidentes de motos caiu de 815 (em 2011) para 757 em (2012). Caso a média de 2013 se mantenha, o número de mortes pode ainda ser menor do que 2012.

— A exigência das placas vermelhas nas motos de trabalho e a Lei Seca são o que mais influenciam na redução de óbitos. No ano passado, a Lei Seca abordou 282.215 veículos, dos quais mais de 90 mil eram motos. Fizemos campanhas educativas, mas não surtiram efeitos — afirmou Veiga.

Até 2020, ONU quer diminuir à metade número de acidentes

A Assembleia Geral das Nações Unidas, por meio da Resolução publicada no dia 2 de março de 2010, proclamou o período de 2011 a 2020 a Década de Ações para a Segurança Viária. A meta é reduzir em 50% os acidentes de trânsito em todo o mundo, que matam cerca de 1,3 milhão de pessoas por ano.

A Resolução recomendou aos 192 países-membros da ONU a elaboração de um plano diretor para guiar as ações nessa área durante os próximos dez anos. A Organização Mundial de Saúde (OMS) vai coordenar os esforços globais ao longo da década e monitorar os progressos em âmbitos nacional e internacional.

A medida foi criada em função dos índices alarmantes de mortes no trânsito em todo o mundo. O Brasil, por exemplo, está entre os cinco países onde mais ocorrem acidentes com mortes no trânsito.

— Entre os desafios está o de educar a população a fim de adquirir comportamentos mais seguros no trânsito. O acidente, além de causar um grande impacto no PIB, gera outro às famílias. É preciso também um controle efetivo da velocidade, por meio de equipamentos eletrônicos, além de desenvolver programas para melhorar o comportamento dos usuários no trânsito — afirmou Maria Cristina Hoffmann, coordenadora-geral de Qualificação do Fator Humano no Trânsito do Denatran.

De acordo com a ONU, as colisões ferem de 20 a 50 milhões de pessoas a cada ano e, em muitos países, os cuidados de emergência às vítimas são inadequados.

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