Falta de fiscalização de caminhões agrava situação nas estradas brasileiras - O GLOBO, 30/03/2011 às 23h24m; Alessandra Duarte
RIO - Nas rodovias federais do Brasil, um caminhão pode andar uma distância equivalente à de Brasília até Belo Horizonte, ou à de São Luís a Belém, sem passar por nenhum posto que pese sua carga. Com 57 mil quilômetros de estradas federais sob responsabilidade do Ministério dos Transportes, hoje o país tem 70 postos de pesagem - um posto a cada 814 quilômetros. Para efeito de comparação, nos Estados Unidos, num trajeto como o de Miami a Nova Jersey, há um posto de pesagem a cada cerca de 170 quilômetros. A falta de controle no Brasil ajuda a agravar a calamidade nas estradas - apenas no carnaval deste ano, foram 213 mortes só nas rodovias federais.
Programa do governo federal que deveria melhorar a fiscalização do excesso de carga dos caminhões - causador de prejuízos de até R$ 10 bilhões por ano e que, pelo desgaste que provoca, reduz em mais da metade a vida útil de uma rodovia -, o Plano Nacional de Pesagem (PNP) está atrasado.
Um acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) do fim do ano passado mostra que a só conclusão da primeira etapa do plano, em relação ao cronograma original, está atrasada em mais de dois anos. Já a segunda e última etapa espera por um edital de licitação desde pelo menos junho do ano passado. A falta de conservação das estradas e o excesso de peso dos veículos estão entre os principais motivos para a ocorrência de acidentes graves, segundo estudo da Pamcary, seguradora especializada em transporte de carga.
Segundo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), vinculado ao ministério e responsável pelas rodovias federais não concedidas, elas deveriam ter pelo menos 239 postos de pesagem (o total de postos previstos pelo PNP; 78 na primeira etapa, 161 na segunda), mais que o triplo da quantidade atual.
Licitação adiada em quase um ano
De número 2577/2010, o acórdão do TCU, relatado pelo ministro Walton Alencar Rodrigues, afirma que, à época (outubro de 2010), faltavam ainda "dezoito postos que não entraram em operação". Hoje, segundo o Dnit, ainda falta entrar em funcionamento sete postos da primeira fase. Um deles, por exemplo, fica em Minas - estado com alguns dos mais altos índices de acidentes nas estradas, pela grande extensão da malha rodoviária -, no KM 310 da BR-116 (sentido Teófilo Otoni).
Acompanhando o PNP desde 2006, o TCU havia constatado atraso já naquele período, devido a "problemas técnicos e orçamentários e à escassez de recursos humanos". Em 2007, registrou que tinham ocorrido "liberações orçamentárias inferiores à previsão do Dnit" - o que teria levado a adequações como reformar postos que precisariam, pelo mau estado de conservação, serem reconstruídos.
Naquele ano, o PNP passou a integrar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC); o Dnit informou que a primeira etapa recebeu do PAC R$ 261,4 milhões. No período, o TCU disse ainda que "o cronograma inicialmente previsto havia sido alterado, com a previsão de conclusão da primeira fase para agosto de 2008. Para os demais postos, a previsão foi para outubro de 2008". Após o cronograma inicial ser atualizado, "o lançamento desse edital estava previsto (...) para junho de 2010". Agora, segundo o Dnit, o edital está previsto para abril.
A falta de fiscalização do transporte de carga acaba fazendo com que estradas do país não durem mais que cinco anos. Segundo estudo do Instituto Ilos, consultoria da área de logística e transportes, uma sobrecarga de 20% reduz a vida útil da rodovia em 55%. Uma via projetada para durar dez anos passa a durar 4,5 anos. Ainda segundo o Ilos, hoje 56% das vias pavimentadas no país estão desgastadas, com buracos, afundamentos ou destruídas.
Segundo João Fortini Albano, da Escola de Engenharia da UFRGS e autor de estudo usado na elaboração do PNP, para cada R$ 1 não aplicado em conservação, gastam-se R$ 3 depois em restaurações ou reconstruções.
- O excesso de carga, quando unido à falta de conservação adequada, causa prejuízos de até R$ 10 bilhões por ano. Já vi casos de sobrecarga de 50%! - sublinha o pesquisador, para quem o PNP "está em passo de tartaruga". - Aqui, onde 60% das cargas são transportadas por rodovias, as estradas geralmente são construídas para durar dez anos. Nos EUA e na Inglaterra, por exemplo, duram 20.
- O PNP é importante, mas está devagar. A média de sobrecarga tem sido de 20% acima do máximo permitido por eixo do caminhão. A tolerância hoje, por lei, é de sobrecarga, por eixo, até 7,5% - diz Newton Gibson, presidente da Associação Brasileira de Transporte de Carga e Logística.
Segundo a assessoria de imprensa do Dnit, o que foi priorizado pelo PNP está em funcionamento. Sobre o fato de o edital de licitação da segunda fase ainda não ter saído, o órgão informou que o plano se adequou ao cronograma de liberação de recursos do PAC, "que prevê recursos para que isso seja feito neste semestre", além de ter tido que se adequar também às recomendações do TCU e que passar pela área de licitação e procuradoria do Dnit.
O órgão destaca que a situação é muito melhor hoje: "das 13 balanças que funcionavam em 2003, passamos para 70 em 2011. Este é o maior número de postos que já operaram no país. Entre 2000 e 2001, nenhuma balança funcionou nas rodovias federais".
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