domingo, 10 de março de 2013

O PREÇO DA INÉRCIA




ZERO HORA 10 de março de 2013 | N° 17367

O PREÇO DA INÉRCIA. Inoperância custa ao Estado R$ 20 bilhões

Falta de continuidade de obras e planejamento de longo prazo explicam por que o RS tem o pior índice de pavimentação do Brasil, que se traduz em estradas ruins, mortes no trânsito e perdas na economia

Gaúcho gosta de ser diferenciado, para melhor. O problema é que, em termos de rodovias, é exemplo de atraso. Veja comparação com São Paulo: em 10 anos, as estradas duplicadas avançaram 1,6 mil quilômetros e hoje equivalem a 13% do total da malha pavimentada. No RS, as duplicações somaram apenas 146,9 quilômetros. Nem um décimo do ritmo paulista, conforme dados dos departamentos que cuidam das rodovias nos dois Estados. Com isso, apenas 3,5% das estradas asfaltadas em que os gaúchos circulam são duplicadas.

Certo, São Paulo é o Estado mais rico do país. Então que tal a comparação com o Paraná, com economia e população parecidas? O RS continua perdendo feio. A malha pavimentada paranaense é de 20,3 mil quilômetros, enquanto no Estado, conforme o Daer, soma 13,1 mil quilômetros. A extensão duplicada do Paraná abrange 973 quilômetros, o dobro da gaúcha. Com baixos investimentos nas últimas três décadas, os gaúchos tiveram apenas 714 quilômetros pavimentados de 2002 até o ano passado. Um crescimento pífio de 5,7%. Enquanto isso, a frota de automóveis avançou 74% e a de caminhões, 44%.

E qual o custo dessa inoperância? A cada ano um pedaço maior das riquezas se perde em rodovias. Cálculo da consultoria Intelog aponta que, em 2011, o custo logístico gaúcho foi equivalente a 18,89% do PIB, uma das maiores taxas do país e bem acima do nível de países desenvolvidos, entre 6% e 8%. Como dois terços desse custo é rodoviário, as estradas esburacadas, engarrafadas e sem asfalto impuseram, em 2011, perdas de quase R$ 20 bilhões à economia. Seria dinheiro suficiente para construir mais de 20 estradas como a Rodovia do Parque, a mais importante em andamento no Rio Grande do Sul.

– O Estado tem uma malha muito pobre. Se olharmos para o mapa do Paraná, parece uma teia – diz Paulo Menzel, da Intelog Logística e coordenador do Fórum Temático de Infraestrutura da Agenda 2020.

Enquanto no Rio Grande do Sul 95 cidades não têm acesso asfáltico – um quinto do total de municípios –, no Paraná o número cai para seis.

Um dos fatores que explica a carência das rodovias é a descontinuidade administrativa e a falta de um planejamento de Estado, e não de governo, imune a mudanças no comando do Piratini. Nas últimas décadas, os partidos que chegam ao governo têm trocado a cada quatro anos e, com a alternância de gestão, projetos são paralisados. Esquadrinhando os dados do Dnit e dos departamentos estaduais, é possível detectar a baixa capilaridade das rodovias pavimentadas. Enquanto o RS tem apenas 699 quilômetros de estradas municipais asfaltadas, o Paraná conta com 6,3 mil quilômetros e São Paulo, 11 mil quilômetros.

Em relação à qualidade das estradas, uma das explicações pode ser encontrada no tipo de gestão. No Estado, apenas 3,6% das rodovias públicas – e gratuitas – são avaliadas como ótimas. Na malha concessionada, apesar da polêmica sobre os pedágios, a aprovação sobe para 25%. Da mesma forma, um número bem maior de estradas administradas por órgãos estaduais e federais é classificada como ruim em comparação à malha gerida pelo capital privado. Como o governo gaúcho não vai renovar as concessões que findam em 2013, fica a dúvida sobre como evoluirá a qualidade da malha devolvida à gestão pública, normalmente engessada pela burocracia e nem sempre com recursos em caixa para investir.

Verba ideal só vista em ano de eleições

Das 20 melhores rodovias do país, aponta pesquisa da Confederação Nacional do Transporte (CNT), 19 são de São Paulo. Todas concedidas. O acompanhamento da entidade convida a uma reflexão sobre as concessões de rodovias, tema espinhoso no Rio Grande do Sul. A realidade é que, concedidas ou não, as rodovias brasileiras – e não apenas as gaúchas – carecem de investimento. São apenas 12,9% de pavimentação no país e 7,2% no Estado, segundo o Dnit, o que provoca indignação de especialistas como o professor Luiz Afonso dos Santos Senna, do Departamento de Engenharia de Produção e Transportes da UFGRS.

– Isso é uma piada. Quantas décadas de investimentos serão necessários para chegar a ter um percentual de rodovias pavimentadas equivalente ao da Argentina, de 26%? E isso que a Argentina não é nenhum modelo – compara, lembrando outros países do grupo dos Brics, como Rússia e Índia, que têm taxas superiores a 80% e 40% de pavimento, respectivamente.

O Sindicato da Indústria de Construção de Estradas, Pavimentação e Obras de Terraplenagem em Geral no Rio Grande do Sul (Sicepot) calcula que o nível ideal de investimentos para os gaúchos recuperarem o atraso seria de R$ 2 bilhões por ano, divididos entre Estado e União, algo que ocorreu apenas em 2010, um ano eleitoral.

– Em 10 anos, seriam aplicados R$ 20 bilhões em novas rodovias, manutenção, duplicações e melhorias, baixando o custo do transporte ao nível de países desenvolvidos – analisa o presidente do Sicepot, Nelson Sperb Neto.

Nenhum comentário: