segunda-feira, 27 de junho de 2011

A MÁQUINA ASSASSINA

EDITORIAL GRUPO RBS - DIARIO CATARINENSE, 27/06/2011

De que adianta o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) ser considerado um dos mais avançados do mundo se não é respeitado, a exemplo de tantas outras leis neste país? Todos os números referentes ao trânsito no Brasil são assustadores e sublinham a urgência de providências severas para desacelerar a máquina da matança e da mutilação. Neste cenário macabro, Santa Catarina detém o vergonhoso título de Estado campeão brasileiro da carnificina sobre rodas na proporção do número de veículos que integram sua frota. Pior: está também no topo dos índices mundiais de mortes no trânsito por grupo de 100 mil habitantes, 33,1%.

São vários os fatores que influem para a ocorrência de acidentes envolvendo veículos, mas o principal sempre foi o comportamento imprudente dos motoristas, que em Santa Catarina responde por 94% dos registros, segundo as estatísticas policiais. Do começo do ano até o dia 20 deste mês, 414 pessoas morreram em acidentes nas rodovias federais e estaduais que cortam o território catarinense.

As mortes são mais numerosas em colisões frontais, quase sempre provocadas por ultrapassagens proibidas ou forçadas. O excesso de velocidade faz a regra, principalmente nos finais de semana e feriados prolongados. Não temos uma “cultura” de trânsito. O carro, mero e corriqueiro meio de transporte, é alçado à condição de símbolo de status e instrumento de afirmação. O Estado também responde por expressivo percentual das quase 20 mil mortes anuais associadas ao consumo de álcool ao volante, registradas no país depois de a Lei Seca ter entrado em vigor.

Em um seminário internacional sobre o tema, que acaba de ser realizado em Brasília, o diretor geral de Tráfego da Espanha, Pere Navarro, informou que, em 2003, o país decidiu reduzir em 50% as mortes no trânsito. Para tanto, aumentou o número de policiais rodoviários, multiplicou o de radares fixos, e promoveu campanhas publicitárias e educativas de impacto. Mas a “arma” mais eficiente foi punir os transgressores, inclusive com cadeia. Em poucos anos, a mortalidade diminuiu 57%. Aqui, anda-se na contramão da vida. Os infratores, até mesmo os responsáveis por mortes, quase sempre ficam impunes ou sofrem apenas suaves penalidades.

A exemplo do que foi feito na Espanha, trata-se de aplicar a lei em toda a sua extensão e rigor. Lugar de assassino sobre rodas também é na cadeia. De que adianta cassar hoje a carteira de habilitação de um transgressor ou bêbado se amanhã ou depois ela será liberada? Afaga-se o matador, e não se faz justiça para com as suas vítimas e suas famílias. E a máquina assassina acelera estrada afora com o aditivado combustível da impunidade e da cumplicidade do poder público que não toma providências.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - De que adiantam as leis se elas não são aplicadas. A lei seca seja o exemplo da Lei dos crimes hediondos e de outras que ousaram ser rigorosas. O arcabouço jurídico é como a cobra comendo o rabo, se autodevora diante das brechas, divergências, centralização no STF, contradições, descaso e benevolências. Assim, a justiça aplica o que quer e interpreta como quer à luz da cabeça do magistrado sem seguir o objetivo (a vontade do legislador), o propósito (normativo), o princípio (coatividade) ou a finalidade da lei (o bem comum).

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