BLOG DO MAJOR RONIE COIMBRA, segunda-feira, 26 de agosto de 2013
Opinião por Ronie de Oliveira Coimbra*
Assunto que está a permear a internet recentemente é o caso do ciclista que perdeu um braço após ser atropelado na Avenida Paulista em São Paulo, no dia 10 de março de 2013, eis que a Justiça decidiu não processar o atropelador – que após fugir do local do acidente, ainda jogou o braço da vítima, que ficara preso ao veículo, em um córrego - por tentativa de homicídio com dolo eventual (assumir o risco de assumir o resultado), decisão que obviamente derramou sobre a vítima um sentimento de injustiça, pois a perda que teve no episódio, tanto física, quanto psicológica, não vai ter o reparo que considerava justo, e que se manifestou dizendo:
"Achava que a lei ficaria do meu lado, mas ela ficou do lado dele", disse David (a vítima do atropelamento.) "É uma injustiça e uma incompetência da Justiça. Só alimenta a impunidade para pessoas que cometem crime no trânsito. No final, elas saem pagando uma cesta básica. É muito injusto, não só comigo, mas com outras vítimas de acidente de trânsito."
Pois bem, vou lhes contar a realidade que enxergo, e, embora não tenha “grande saber jurídico”, vou ousar e expressar minha opinião a respeito da legislação de trânsito brasileira, na verdade a verdadeira culpada pela sensação de injustiça de David, e não o Magistrado (Justiça) que tomou a decisão de não recepcionar a denúncia em desfavor do motorista. Caso alguém enxergue diferente, o espaço para o contraponto está à disposição.
Primeiro que está na Código de Trânsito Brasileiro (CTB) a descrição dos crimes de trânsito e suas penas. Ali está posta, descrita, a ação ou omissão, e suas consequências. Especificamente quanto a lesão corporal, o CTB, diz, em seu Art. 303 que “praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor submete o autor a possibilidade de penas de detenção, de seis meses a dois anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, e quando houver agravantes a pena pode ser aumentada de um terço à metade, mas, mesmo com esta majoração, ela será pequena e a pessoa receberá, no máximo, penas alternativas; e para o crime de homicídio de trânsito, o Art. 302 do CTB descreve assim: Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor, com penas de detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, e, igualmente ao crime de lesões corporais, prevê majoração da pena de um terço a metade se houver agravantes, podendo, portanto, chegar a seis anos de detenção.
O CTB não prevê lesão corporal dolosa ou homicídio doloso de trânsito, mas, para estes delitos somente as modalidades culposas, ou seja, o autor da conduta (crime) não teria a intenção, a vontade de produzir o resultado, que acontece por negligência, imprudência ou imperícia. Aqui começam os problemas, pois para que o dolo eventual seja estabelecido, em um exemplo de homicídio de trânsito em que o motorista ingerira bebida alcoólica, o Magistrado deverá admitir que o condutor já tinha intenção de matar, ou assumira o risco de matar, por exemplo, antes de se embriagar e conduzir o veículo, e esta admissão é excepcionalíssima, e a regra é que os delitos de trânsito de lesões corporais e homicídio sejam culposos, sem intenção, de acordo com a previsão do CTB.
Em instâncias iniciais da Justiça, em razão do clamor da população, e as vezes da mídia, o Magistrado acaba por admitir uma denúncia por dolo eventual, mas com grandes risco destas decisões sofrerem reforma nas estâncias superiores, a exemplo do STF, fazendo a tese cair por terra.
Vez em quando legisladores, para aplacar a fúria das famílias dizimadas por motorista homicidas, irresponsáveis, ou desvairados, com cobertura pirotécnica da mídia, alteram a legislação e dizem que ela atingiu o ápice do seu rigor. Aqui outro engodo, pois o tão propalado rigor é uma falácia, e na prática inexiste.
A solução, penso, é simples, mas os legisladores não a querem produzir. Quais os motivos do desinteresse??? Qual o motivo da mídia de veicular que “agora” a Lei de trânsito é rigorosa e vai funcionar?
O Ministro Marco Aurélio, do STF, quando comentou sobre um voto favorável a reforma de uma admissão de homicídio com dolo eventual, para homicídio culposo de trânsito, deu o seguinte recado ao Congresso, em razão de que alguns o criticavam: “Se querem que o homicida do trânsito tenha penas rigorosas, que prevejam isto no CTB”. E aqui deixo claro a mudança para mais rigor permitiria que a Lei continuasse a ser condescendente quando efetivamente ocorresse um acidente de trânsito em que a pessoa agiu somente com imprudência, negligência ou imperícia, porém, rigorosa quando o motorista adotasse condutas extremamente perigosas, como ingerir bebida alcoólica e dirigir, ou dirigir sem estar habilitado.
Daí, eu, em minha humilde base, fico a me perguntar porque os congressistas iriam querer resolver este problema que é essencialmente da sociedade? Qual o benefício que teriam? Ganhariam algo com isto?
Opinião por Ronie de Oliveira Coimbra*
Assunto que está a permear a internet recentemente é o caso do ciclista que perdeu um braço após ser atropelado na Avenida Paulista em São Paulo, no dia 10 de março de 2013, eis que a Justiça decidiu não processar o atropelador – que após fugir do local do acidente, ainda jogou o braço da vítima, que ficara preso ao veículo, em um córrego - por tentativa de homicídio com dolo eventual (assumir o risco de assumir o resultado), decisão que obviamente derramou sobre a vítima um sentimento de injustiça, pois a perda que teve no episódio, tanto física, quanto psicológica, não vai ter o reparo que considerava justo, e que se manifestou dizendo:
"Achava que a lei ficaria do meu lado, mas ela ficou do lado dele", disse David (a vítima do atropelamento.) "É uma injustiça e uma incompetência da Justiça. Só alimenta a impunidade para pessoas que cometem crime no trânsito. No final, elas saem pagando uma cesta básica. É muito injusto, não só comigo, mas com outras vítimas de acidente de trânsito."
Pois bem, vou lhes contar a realidade que enxergo, e, embora não tenha “grande saber jurídico”, vou ousar e expressar minha opinião a respeito da legislação de trânsito brasileira, na verdade a verdadeira culpada pela sensação de injustiça de David, e não o Magistrado (Justiça) que tomou a decisão de não recepcionar a denúncia em desfavor do motorista. Caso alguém enxergue diferente, o espaço para o contraponto está à disposição.
Primeiro que está na Código de Trânsito Brasileiro (CTB) a descrição dos crimes de trânsito e suas penas. Ali está posta, descrita, a ação ou omissão, e suas consequências. Especificamente quanto a lesão corporal, o CTB, diz, em seu Art. 303 que “praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor submete o autor a possibilidade de penas de detenção, de seis meses a dois anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, e quando houver agravantes a pena pode ser aumentada de um terço à metade, mas, mesmo com esta majoração, ela será pequena e a pessoa receberá, no máximo, penas alternativas; e para o crime de homicídio de trânsito, o Art. 302 do CTB descreve assim: Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor, com penas de detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, e, igualmente ao crime de lesões corporais, prevê majoração da pena de um terço a metade se houver agravantes, podendo, portanto, chegar a seis anos de detenção.
O CTB não prevê lesão corporal dolosa ou homicídio doloso de trânsito, mas, para estes delitos somente as modalidades culposas, ou seja, o autor da conduta (crime) não teria a intenção, a vontade de produzir o resultado, que acontece por negligência, imprudência ou imperícia. Aqui começam os problemas, pois para que o dolo eventual seja estabelecido, em um exemplo de homicídio de trânsito em que o motorista ingerira bebida alcoólica, o Magistrado deverá admitir que o condutor já tinha intenção de matar, ou assumira o risco de matar, por exemplo, antes de se embriagar e conduzir o veículo, e esta admissão é excepcionalíssima, e a regra é que os delitos de trânsito de lesões corporais e homicídio sejam culposos, sem intenção, de acordo com a previsão do CTB.
Em instâncias iniciais da Justiça, em razão do clamor da população, e as vezes da mídia, o Magistrado acaba por admitir uma denúncia por dolo eventual, mas com grandes risco destas decisões sofrerem reforma nas estâncias superiores, a exemplo do STF, fazendo a tese cair por terra.
Vez em quando legisladores, para aplacar a fúria das famílias dizimadas por motorista homicidas, irresponsáveis, ou desvairados, com cobertura pirotécnica da mídia, alteram a legislação e dizem que ela atingiu o ápice do seu rigor. Aqui outro engodo, pois o tão propalado rigor é uma falácia, e na prática inexiste.
A solução, penso, é simples, mas os legisladores não a querem produzir. Quais os motivos do desinteresse??? Qual o motivo da mídia de veicular que “agora” a Lei de trânsito é rigorosa e vai funcionar?
Quem lucra com toda esta violência no trânsito? Como diria Leonel Brizola: “Existem interésses...”.
Não tenho todas as respostas para tanta inépcia, mas tenho a percepção de que bastaria apor no CTB a pena específica, e rigorosa - similares aos crimes de mesmo tipo, previstos no Código Penal Comum, a exemplo de lesão corporal e homicídio - para os crimes de lesão corporal culposa de trânsito, e de acordo com o resultado da lesão - se leve, grave e gravíssima – e para os de homicídio culposo de trânsito, com agravantes rigorosos, tanto para a lesão, quanto para o homicídio, por exemplo para quando o condutor estivesse embriagado, inabilitado, ou se possuísse habilitação, estivesse com ela suspensa ou cassada. Esta medida, creio, acabaria com interpretações dos tribunais, tanto de primeiras instâncias, quanto os superiores; e jogaria por terra, ao menos nos crimes de lesão corporal e homicídio de trânsito, a discussão de conceitos muitos próximos, portanto pedregosos de lidar, a exemplo de culpa, culpa consciente e dolo eventual; e acabaria também com a indústria recursal. Sim, porque apesar da boa vontade de alguns Magistrados em determinar o dolo eventual, quando em se tratando de delitos de trânsito previstos no CTB, não está expresso nesta Lei esta possibilidade dolosa, e sim, somente a culposa.
O Ministro Marco Aurélio, do STF, quando comentou sobre um voto favorável a reforma de uma admissão de homicídio com dolo eventual, para homicídio culposo de trânsito, deu o seguinte recado ao Congresso, em razão de que alguns o criticavam: “Se querem que o homicida do trânsito tenha penas rigorosas, que prevejam isto no CTB”. E aqui deixo claro a mudança para mais rigor permitiria que a Lei continuasse a ser condescendente quando efetivamente ocorresse um acidente de trânsito em que a pessoa agiu somente com imprudência, negligência ou imperícia, porém, rigorosa quando o motorista adotasse condutas extremamente perigosas, como ingerir bebida alcoólica e dirigir, ou dirigir sem estar habilitado.
Daí, eu, em minha humilde base, fico a me perguntar porque os congressistas iriam querer resolver este problema que é essencialmente da sociedade? Qual o benefício que teriam? Ganhariam algo com isto?
Depois os parlamentarem, alguns, claro, se sentem ofendidos quando o Judiciário toma decisões legislativas. Princípio básico que conheço: Quando alguém não ocupa o seu espaço, alguém acaba por ocupar, bem, se é que querem (os congressistas) ocuparem este espaço. Enqquanto isto as pessoas que integram a sociedade, a exemplo do caso do David, que perdeu o braço em razão de um atropelamento, no qual o condutor fugiu, e ainda jogou o braço que ficara preso ao veículo em um córrego, não entende por que a Lei posta não lhe alcança justiça, e eu não entendo, e você leitor também não deve entender, porque os que estão postos para produzirem boas leis não o fazem.
*Major na Brigada Militar
*Major na Brigada Militar
Nenhum comentário:
Postar um comentário