segunda-feira, 21 de maio de 2012

EPIDEMIA

BEATRIZ FAGUNDES, O SUL

Porto Alegre, Segunda-feira, 21 de Maio de 2012.

Os números revelam que o País vive uma verdadeira epidemia de lesões e mortes no trânsito. Alexandre Padilha

Assisti, na semana passada, uma mãe enterrar seu filho de 19 anos. A expressão de seus olhos era de terror. Terror puro. Gelado. Não encontrei palavras para tentar aplacar sua dor devastadora. Na verdade, cheguei a perder a voz. Apenas fiquei ali ao seu lado. Seu marido ficou sentado ao lado do caixão. Não olhou para ninguém. Por alguns momentos imaginei que aquele olhar que parecia atravessar a madeira da urna que aprisionava para sempre o seu "moleque". Na verdade, estava fixado em cenas do passado. Tenho certeza que ele estava vendo cada cena que eles viveram. O nascimento, os primeiros passos, quando ele falou papai pela primeira vez, as centenas de vezes que foram ao estádio de futebol, às peladas na praia, às pescarias e tantas, meu Deus tantas memórias! Ele estava ali, sentado parecia feito de cera.

O menino sofreu um acidente de moto há cerca de dois meses. Fraturou a coluna, quebrou as duas pernas e nem chegou a sair do coma. Não olhei o corpo. Quero manter a lembrança daquele moleque que teimava em me dar uma bitoca desde os 5 anos, quando o conheci. Era surfista, fissurado em informática e queria ser astrônomo. Ganhou a moto no último Natal. Conseguiu depois de muito "choro" convencer o pai a lhe dar a maldita máquina que lhe roubaria a vida. No dia do acidente, antes de sair, ele e a mãe brigaram feio. Por causa da moto. As palavras foram ásperas e pela, primeira vez, ele saiu sem lhe dar o abraço e o beijo como fizera por toda a sua curta vida. Teria sido o seu último beijo. Ela não se perdoa. Na verdade, sua intuição lhe avisou antes da tragédia que se avizinhava.

A vida é tão frágil e nós agimos como se a eternidade fosse nossa. Enquanto há vida há esperança. Em varias ocasiões, ela me disse que dedicaria sua vida exclusivamente a cuidar do filho. Chegaram até a consultar um arquiteto para mudar tudo na casa, já que era certo que o menino ficaria paraplégico. Fazia planos e dizia que, afinal, qual era o problema? Ele poderia fazer a faculdade de astronomia e quem sabe o quanto poderia contribuir para a humanidade. Os sonhos acabaram. A dor dos pais é indescritível. Vinte e três pessoas morrem em acidentes de moto por dia no Brasil. O Ministério da Saúde revela que ocorrem 10 mil acidentes com motos por ano no Brasil.

Aliás, essas estatísticas mostram que motociclistas morrem mais que vítimas de armas de fogo. "Os números revelam que o País vive uma verdadeira epidemia de lesões e mortes no trânsito", afirmou o ministro da Saúde Alexandre Padilha. O Dr. Marcelo Rosa, do Instituto de Ortopedia do Hospital das Clínicas de São Paulo, foi mais explícito: "É uma epidemia, porque os números mostram um alto índice de acidentados de moto, um alto índice de sequelados. Tudo o que caracteriza uma epidemia, toda a mobilização da área da saúde, custos sociais, isso tem que ser caracterizado como epidemia. Como a que tivemos da gripe suína.

Como epidemia, elas exigem medidas fortes, precisam de estudos estatísticos adequados, precisam da intervenção da engenharia de tráfego, precisa de medidas fortes como foi tomado na gripe suína", diz o médico. Aos que ficam, resta à eterna saudade!

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