terça-feira, 26 de abril de 2011

TRAGÉDIA ANÚNCIADA NAS ESTRADAS

Milton Corrêa da Costa - o globo, 25/04/2011


Já havia um número previsto de mortos e feridos em estradas no feriado prolongado de Tiradentes e Semana Santa, com a estatística a ser divulgada nesta segunda-feira. Foram 175 mortos nas estradas federais e 2.274 feridos, envolvendo 3.861 acidentes. Triste, permanente, macabra, porém realista previsão. São as vítimas fatais ou não, das estradas brasileiras, fruto da imprudência, da hiperagressividade, da falta de educação e do estresse no trânsito.

No último feriadão de carnaval, o mais violento de todos os tempos, foram números de uma guerra sempre anunciada e praticamente perdida. Foram 213 mortes e 2.441 feridos, em 4.165 acidentes ocorridos. Dá até para asssustar. É o retrato da exposição ao perigo ao volante e da falta de disciplina consciente de motoristas e motociclistas, além da falta de estrutura dos organismos de administração e fiscalização de rodovias no Brasil. Sobra imprudência e falta estrutura, inclusive de estradas em bom estado de conservação. Note-se que estamos falando tão somente do que ocorreu neste carnaval em rodovias federais. Ou seja, a tragédia em números foi muito maior.

O que nos deixa de mãos atadas é que nos feriadões prolongados já se sabe anteriormente que há uma estatística previsível de mortes e mutilações nas estradas brasileiras, muitas delas em precárias condições de pavimento, iluminação e sinalização, e não há o que se possa fazer para minimizar o macabro prognóstico. Por mais que se tenha contingente humano nas polícias rodoviárias, não há como fiscalizar cada motorista. Durante o carnaval passado, somente num acidente na BR-282, em Santa Catarina, 27 pessoas morreram numa colisão de um ônibus de turismo e um caminhão carregado de madeira.

A verdade é que há um cenário permanente de veículos retorcidos, vítimas ensanguentadas, dor e sofrimento no violento trânsito brasileiro. A disciplina consciente de boa parte de nossos condutores inexiste. No máximo, tiram o pé do acelerador junto aos radares de fiscalização de velocidade; depois, prosseguem disputando o "rali da morte". Frise-se que em países mais civilizados no trânsito, onde há disciplina consciente, não tem placa informativa anterior indicando a localização de radar. A advertência sobre a existência de radares acaba é beneficiando os imprudentes e mal educados do volante.

Não há cultura de boa educação de motoristas e motociclistas e a psicologia do trânsito, ciência que estuda e diagnostica o comportamento de condutores de veículos, está sempre em xeque. Que estranho poder possui o binômio trânsito-automóvel que transforma pessoas educadas no convívio social em agressivos, imprudentes, deseducados e muitas vezes assassinos do volante?

Não seria o momento de se rediscutir os conceitos e os testes empregados na avaliação psicológica de motoristas, revendo as normas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Trânsito?

Que perfil devemos desejar para um motorista menos agressivo e mais equilibrado, num trânsito urbano cada vez mais caótico, principalmente nos grandes centros urbanos? A psicologia de trânsito precisa evoluir para detectar, nos candidatos à obtenção da CNH e para os que a renovam, distúrbios sociopatas ou psicóticos, referentes a acentuado estresse e hiperagressividade ou mesmo doença mental.

Neste feriadão, alguns de nossos 'ases do volante' continuaram bebendo e dirigindo, usando outras drogas e energéticos e transitando como 'malandros nacionais' pelo acostamento de rodovias. Almejaram, pela esperteza, chegar mais seu cedo aos seus destinos - alguns ficaram pelo meio do caminho. Também continuaram ultrapassando nas curvas, dirigindo em alta velocidade e efetuando manobras arriscadas. Verdadeiros donos dos seus espaços e dos demais. É a célebre cultura, muito arraigada, do levar vantagem em tudo.

Infelizmente, no trânsito brasileiro, por enquanto, ainda é preciso punir para reeducar. A barbárie e a carnificina prosseguirão no próximo feriadão de Corpus Christi. Quem sobreviver à sanha assassina dos 'espertos do volante', verá. O prognóstico maior, apesar do advento da Lei Seca, também já está definido: mais 35 mil pessoas morrerão em 2011 na tragédia anual e sempre anunciada do trânsito brasileiro. Parece mesmo que permaneceremos, ad aeternum, em estado letárgico, anunciando as estatísticas macabras da imprudência no trânsito. Triste, sombria e infinita realidade.

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