sexta-feira, 28 de junho de 2013

IMPRENSA, MEMÓRIA FRACA E OS CRIMES CORPORATIVOS

PARA LEMBRAR...

PORTAL IMPRENSA, 03/03/2008

Wilson da Costa Bueno 



A imprensa brasileira se caracteriza por exibir uma memória terrivelmente fraca. Isso quer dizer que ela, apesar de conhecer e divulgar fatos relevantes, rapidamente os esquece.

Alguns episódios recentes e outros mais distantes servem para ilustrar esta deficiência do chamado "fosfato de interesse público" que infelizmente acomete a mídia nacional.

No mês de fevereiro, muitos veículos importantes trouxeram à baila os inúmeros acidentes ocorridos com o Fox, um carro da Volks, e que provocaram mutilação comprovada em quase uma dezena de proprietários, em virtude de esmagamento do dedo pelo rebatimento do banco traseiro.

Evidentemente, como faz a indústria tabagista, a de agrotóxicos, a de saúde etc, a empresa creditou a culpa às vítimas, alegando que há explicações para o uso correto no manual do automóvel. Quer dizer, proclamou hipocritamente sua isenção no episódio, embora desde 2006, segundo matéria publicada no Estadão de 16/02/2008, até o presidente da República já soubesse do problema.

A questão nesse caso não é se o uso adequado está ou não no manual (todo mundo sabe que a leitura do manual não é comum para a maioria das pessoas) , mas no cuidado que devem ter as empresas para evitar acidentes com os usuários de seus produtos, sobretudo (e aí está a omissão severa da Volks) quando alguns deles já foram duramente vitimados. A pergunta que fica é: se havia um risco real (a Volks não ignorava os acidentes, não é verdade?) porque ela não tomou qualquer medida antes que a imprensa e as autoridades resolvessem investigar o problema? A empresa publicou no seu site ou em releases para a mídia alguma informação que pudesse alertar os consumidores e evitar novos casos? Por que ela não providenciou imediatamente a peça (uma borracha que funciona como um simples paliativo) para diminuir o risco? Por que não um pequeno anúncio (como gasta dinheiro com publicidade a indústria automotiva, inclusive estimulando a velocidade!) em respeito aos seus consumidores?

Em fevereiro deste ano, a Ford resolveu recolher perto de uma centena de picapes Pantanal porque descobriu (descobriu tarde, não é mesmo?) que elas tinham um problema gravíssimo de chassi. A empresa, segundo notícias da imprensa, alertou os proprietários dos carros com defeito de que, se eles não os devolvessem, ela ficaria isenta de responsabilidade sobre possíveis acidentes. Ou seja, coloca produto perigoso no mercado e parte de dedo em riste para os proprietários. Será que ela arriscou a ver repetido o caso famoso do Ford Pinto ocorrido na década de 80 nos EUA, um dos maiores crimes corporativos da história empresarial?

Em coluna anterior, já havíamos denunciado o problema sério do "recall" de automóveis em nosso País, com um número surpreendente (escandaloso) de chamamentos para troca de peças. Será interessante avaliar a proporção em que crescem os recalls e o incremento do volume de carros que as montadoras despejam carros na praça (somos já o sétimo país em produção de carros e de poluição automotiva). Será que a ânsia de vender tem tornado o controle de qualidade menos "controlado"? Será que efetivamente o controle de riscos é uma preocupação das fabricantes de veículos automotores?

A imprensa, ao que parece, já deixou de lado o problema, assim como colocou sob o tapete todos os recalls anteriores (e são dezenas e dezenas nos últimos anos), como se fosse comum produzir carros com defeito. Por que não uma investigação mais profunda nesse caso? Por que não exigir das autoridades maior responsabilidade dos fabricantes e puni-los exemplarmente a cada recall? Afinal de contas, em muitos casos, até a descoberta do problema, milhares de usuários têm corrido riscos e, após o aviso (uma mensagem quase sempre cínica e que invoca responsabilidade social às avessas!) vão ter o desconforto de buscar as concessionárias para consertar um defeito que veio de fábrica? Quão grande deve ser o lobby em Brasília (é comum ver autoridades e até o presidente Lula abraçado com os empresários do setor) para que , apesar dos lucros fabulosos, as montadoras continuem lesando os consumidores com seus produtos sem qualidade?

A imprensa não tem se esquecido apenas das montadoras. A retirada do mercado de medicamentos (alguns de grande consumo, como o Vioxx,) tem sido também cada vez mais comum e a imprensa necessariamente não se pergunta: o que está por trás dessas falhas contínuas em áreas tão críticas para a saúde da população? Afinal de contas, quem deve vigiar (FDA, Anvisa etc) está vigiando mesmo ou anda à mercê dos que produzem sem qualidade?

Embora esteja com a edição esgotada no Brasil, o livro Crimes corporativos: o poder das grandes empresas e o abuso da confiança pública, de Russel Mokhiber, publicado pela Scritta, em 1995, portanto há 13 anos, está mais do que atual. Lá encontraremos com facilidade os mesmos setores aqui apontados, envolvidos em crimes corporativos que causam arrepios. A Ford, a GM, a Nestlé, laboratórios farmacêuticos aos montes (você se lembra das aberrações provocadas pela Talidomida?) e também a indústria agroquímica (triste lembrança do caso Bhopal) estão lá. Quem quiser, pode ler também o capítulo sobre iniciativa privada e interesse público no livro Comunicação Pública, editado recentemente pela Atlas, onde reproduzimos alguns destes terríveis deslizes éticos.

A imprensa precisa ser mais investigativa e não noticiar crimes corporativos a partir apenas dos releases das empresas que os cometem. Ela precisa exigir mais responsabilidade e enxergar além da notícia. Ela precisa cobrar das autoridades uma ação dura contra as falhas recorrentes de fabricação e indicar caminhos, ouvindo especialistas em Direito e Defesa do Consumidor, para coibir essa moderna "farra do boi".

Pedir às empresas que sejam mais responsáveis é "enxugar gelo". Quando os lucros se sobrepõem ao interesse público, muito pouco pode ser feito. A ética e a responsabilidade empresarial continuam sendo, na maioria das vezes, apenas um discurso vazio, legitimado por campanhas publicitárias criadas por agências que também só são sensíveis aos seus bolsos cheios.

Os crimes corporativos precisam ser combatidos com vigor. As empresas têm de andar na linha. É nessa hora que se descobre a verdadeira missão de algumas organizações. Por isso, é preciso tomar cuidado: quem conhece, não confia. Nem nas empresas e na imprensa. Esta anda com a memória fraca de dar dó. Quem sabe, ela esteja mesmo mais preocupada com a espetacularização da notícia e a coleta de anúncios (as empresas que cometem crimes corporativos são também as maiores anunciantes, não é verdade?) do que com a defesa dos interesses da população. Rabo preso com o leitor, o telespectador? Vivemos no mundo do Big Brother, onde o sucesso está nos dias de "paredão". Esta é a verdadeira face de quem mascara os seus objetivos (altos lucros e programas de conteúdo apelativo) com as encenações do Criança Esperança.

Está na hora de a sociedade reagir a esta relação muitas vezes promíscua entre imprensa e interesses empresariais. Vamos cuidar da memória da imprensa. Fosfato nela.


quarta-feira, 12 de junho de 2013

O COMÉRCIO DAS HABILITAÇÕES

ZERO HORA 12 de junho de 2013 | N° 17460

EDITORIAIS

A descoberta de um esquema de comércio de carteiras de habilitação de motoristas, disseminado por todo o Estado, tem implicações que vão além dos demais esquemas de fraude envolvendo de alguma forma o Departamento Estadual de Trânsito (Detran). Quando um documento que, por razões óbvias, exige o máximo de rigor na sua emissão passa a ser fornecido de forma generalizada mediante o pagamento de propina, todos os gaúchos ficam com a vida em risco. Como constatou a Polícia Civil, que ontem cumpriu mandados de busca e apreensão em 24 municípios, há entre os suspeitos de terem pago entre R$ 2 mil e R$ 3 mil para sair dirigindo até quem mal sabe girar a chave na ignição.

Um aspecto particularmente preocupante é que essa prática deveria fazer parte do passado a partir do momento em que a atividade deixou de se constituir em monopólio da Polícia Civil. Concebido como alternativa moralizadora, porém, o Detran já foi vítima de uma megaoperação de desvios por parte de políticos, investigados pela chamada Operação Rodin. E, mais recentemente, ficou comprovado que veículos tinham peças retiradas dentro de seus depósitos, nos quais iam muitas vezes parar por furto ou roubo, levando o proprietário a ser duplamente lesado.

O caso mais recente envolve despachantes, servidores e examinadores de trânsito, além de interessados em comprar o que deveria ser obtido mediante habilitação comprovada. Muitas dessas pessoas seguem atuando na burocracia de trânsito e nas ruas, de onde devem ser afastadas e punidas. Mas o poder público precisa se mostrar capaz de fazer mais, a começar pela criação de mecanismos que impeçam a continuidade desse tipo de prática, que é inadmissível.

VENDA DE CNH NO RS

ZERO HORA 12 de junho de 2013 | N° 17460

PERIGO NAS RUAS. Carteiras vendidas por até R$ 3 mil

Por propinas que oscilariam entre R$ 2 mil e R$ 3 mil, um suposto esquema de corrupção na emissão de carteiras de motorista teria dado licença para condutores despreparados saírem às ruas e colocarem em risco a segurança da população no Rio Grande do Sul.

As investigações da Operação Teseu da Polícia Civil, que ontem cumpriu 65 mandados de busca e apreensão em 24 cidades, levaram à suspeita de que pelo menos dois servidores do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) com cargo de chefia participavam das irregularidades.

Segundo informações preliminares, já que o inquérito está sob segredo de Justiça, alunos de Centros de Formação de Condutores (CFCs) pagariam suborno a examinadores do Detran para serem aprovados em exames teóricos e práticos. Em alguns casos, o dinheiro teria sido entregue a instrutores ou representantes de CFCs, que repassaram o valor aos servidores públicos. A operação, que também conduziu 28 suspeitos ou testemunhas para prestar depoimentos ontem, é fruto de uma investigação policial iniciada em 2011 a pedido do então presidente do Detran, Alessandro Barcellos, e conta com o apoio da atual diretoria.

– Somos investigadores dessa fraude, a corregedoria fez seu trabalho e repassou informações à polícia numa integração institucional – destaca o diretor-presidente do órgão, Leonardo Kauer.

Dois servidores são investigados

Não foi revelado o número de carteiras que teriam sido emitidas irregularmente. Mas, segundo Kauer, serão refeitos todos os exames sobre os quais a polícia lançar suspeita no decorrer das apurações. Em razão do segredo de Justiça, os delegados envolvidos no caso, Joerberth Nunes e Daniel Mendelski, preferem não dar detalhes da investigação. O trabalho envolveu a Delegacia Fazendária com apoio do Gabinete de Inteligência e Assuntos Estratégicos da polícia.

Zero Hora apurou que, entre os servidores públicos investigados, estão o então chefe de Divisão de Exames Teórico e Prático (Divex) do Detran, Carlos Augusto Grendene Langone, e Vanessa Gentil Zerbinatti Vitoria, que respondia pela Coordenadoria de Apoio Operacional da Divex.

Os dois são suspeitos de atuar na manutenção da chamada “rota” de examinadores, ou seja, fazer com que as mesmas pessoas aplicassem os testes sempre junto aos mesmos CFCs a fim de facilitar o funcionamento do suposto esquema. ZH tentou contato com Langone e Vanessa, mas não obteve retorno. Em nota, o Detran informou que “os servidores investigados, que estejam exercendo função de chefia, já estão sendo dispensados da designação, sem prejuízo da instauração de Processo Administrativo Disciplinar”. Para reduzir o risco de fraudes, a entidade pretende iniciar ainda este ano um novo sistema de exames práticos (veja quadro na página ao lado).

A Polícia Civil seguirá investigando suspeitas envolvendo outras irregularidades como a legalização de veículos sinistrados e a anulação fraudulenta de multas. Um despachante foi flagrado oferecendo a uma condutora a eliminação de multas, mas somente a análise de provas poderá confirmar a realização dessa prática.

ADRIANA IRION E MARCELO GONZATTO

A INVESTIGAÇÃO. Como a polícia trabalhou para chegar aos suspeitos

- A operação identificou como um dos problemas o fato de os mesmos examinadores serem mantidos nas mesmas rotas, ou seja, atuando frequentemente nos mesmos CFCs e com os mesmos instrutores.

- Isso, segundo a polícia, propiciaria a criação de laços e criaria ambiente para ilegalidades.

- Essa manutenção dos examinadores nas rotas ocorreria com o respaldo de chefias da Divisão de Exames Práticos e Teóricos do Detran.

- Conforme o ex-presidente da autarquia, Alessandro Barcellos, durante sua gestão, sempre houve orientação para a realização de rodízio entre os profissionais nas diversas rotas.

- Ainda assim, em relação aos investigados, era possível perceber que, quando se ambientavam na nova rota, retomavam as ações ilícitas.

- Segundo Barcellos, é fácil demitir examinadores, que são contratados emergencialmente, mas, neste caso, o ex-servidor fica sem responsabilização criminal. Ao sair do Detran, muitos passam a atuar junto a CFCs como despachantes ou até instrutores.

- O Estado tem hoje 274 CFCs e 13,7 mil credenciados. Como um mesmo profissional pode estar mais de uma vez credenciado, são 17,1 mil credenciamentos.


Situações absurdas durante a repetição de 23 exames

Durante o processo de investigação, policiais e a diretoria do Detran decidiram convocar 23 condutores suspeitos de haver pago pela carteira para refazer o exame. O que testemunharam provocou perplexidade e ilustrou o grau de perigo a que a venda das habilitações estava sujeitando outros usuários das vias públicas: somente um foi aprovado na repetição dos testes práticos.

Em um dos casos mais emblemáticos, um morador de Torres simplesmente não sabia o que fazer depois de entrar no carro. Em vez de girar a chave e colocar o automóvel em movimento, permaneceu sentado com aparente ar de perplexidade diante da profusão de controles da máquina. Em seguida, foi convidado a pilotar uma moto – veículo que também deveria dominar –, e caiu ao chão em vez de seguir em frente.

A lista de situações insólitas inclui ainda a renovação de carteiras. Um despachante já descredenciado pelo Detran teria ajudado uma mulher, aposentada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) devido a transtornos mentais, a revalidar a sua carteira de forma irregular. Isso teria sido feito com a participação de funcionários de um CFC e também é alvo de investigação.

Os absurdos sob investigação incluem ainda o caso de um instrutor de CFC da Capital que sugeriu a uma aluna oferecer propina à examinadora do Detran a fim de passar no teste prático. A servidora recusou a oferta de suborno e registrou o caso na polícia.


SUA SEGURANÇA | HUMBERTO TREZZI


A corrupção continuou

Os mais antigos lembram quando os testes de habilitação para conduzir veículos eram administrados pela Polícia Civil. Tirei minha primeira carteira com policiais civis conferindo. Aulas de trânsito não eram obrigatórias grande parte aprendia aos trancos, no carro do pai.

Na época, proliferavam informes de corrupção nas Ciretran, que eram as seções de trânsito existentes nas grandes delegacias. Zero Hora mesmo realizou a compra de uma carteira de motorista em nome de um morto, no final dos anos 1980. Muitos policiais foram demitidos por venda de documentos.

Tudo mudou em 1997, quando o governo Antônio Britto criou o novo Departamento Estadual de Trânsito (Detran), tirando dos policiais o monopólio dos exames de carteira e também dos depósitos de veículos rebocados. A promessa era de profissionalismo, com técnicos especializados realizando os exames, rigor na apuração das habilidades, depósitos limpos e sem mutretas... Como se vê, não foi bem assim. Além do desvio dos recursos do Detran por políticos, denunciado via Operação Rodin, Zero Hora flagrou em fotos, no ano passado, carros sendo depenados dentro de depósitos oficiais, uma antiga suspeita que acabou comprovada. Agora surge essa grande operação da Polícia Civil, mostrando graves indícios de acertos para facilitar aprovação de motoristas que nem sequer sabem engrenar a primeira marcha. Torna condutores assassinos em potencial, não custa dizer. Ressalva: é necessário elogiar a postura das autoridades. A presidência do Detran é quem iniciou a investigação.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Quando o trânsito estava em poder da polícia civil os serviços eram ótimos, os preços acessíveis e a corrupção muito menor do que é hoje, pois havia comprometimento com a demanda e punição para os corruptos. Hoje, os serviços são demorados, o custo é exorbitante e a corrupção é muito maior, pois os corruptos não são punidos. Cabe lembrar que, com aval da AL-RS e TJ-RS, até agora o Governo do RS não cumpre o dispositivo constitucional que passou os serviços de trânsito para a Brigada Militar (artigo 132 da Constituição do RS) desde a promulgação da lei maior do RS em 03 de outubro de 1989.





quinta-feira, 6 de junho de 2013

FISCALIZAÇÃO NAS ESTRADAS


O Estado de S.Paulo, 06 de junho de 2013 | 2h 05

OPINIÃO

O aumento da fiscalização eletrônica do excesso de velocidade nas rodovias paulistas sob responsabilidade do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) - nas administradas pela iniciativa privada ela já é de boa qualidade -, anunciado pelo governo estadual, é um passo importante para reduzir o elevado número de acidentes nelas registrado, que todos os anos deixa milhares de mortos e feridos. A tragédia do trânsito há muito se tornou um dos grandes problemas enfrentados pelo País e, se São Paulo cumprir a ambiciosa meta fixada com a adoção dessa medida, dará um exemplo aos Estados que enfrentam situação semelhante.

Deve ser feita em breve a licitação para a compra e instalação de 549 radares fixos, dos quais 114 do tipo lombada eletrônica, com registro digital de velocidade, e 124 com dispositivo para a leitura das placas dos veículos e cálculo do tempo da viagem.

Os contratos devem ser assinados em julho e os equipamentos começam a ser instalados em agosto. Com isso, a capacidade desse tipo de fiscalização vai mais do que dobrar até o fim do ano. Hoje, operam nas rodovias estaduais 345 radares fixos, sendo 183 nas administradas pelo DER e 162 nas concedidas a empresas privadas. Com os novos radares, o número total desses aparelhos será de 894.

Há muito que a grande diferença de eficiência da fiscalização entre essas rodovias exigia uma medida do governo destinada a melhorar o desempenho das que estão sob sua responsabilidade. Nos 16,4 mil quilômetros de rodovias administradas pelo DER, a média é de um radar fixo a cada 89,6 km. Nas rodovias sob concessão, a capacidade de fiscalização da velocidade é muito maior. Nos 6,3 mil quilômetros dessa malha, a média é de um radar fixo a cada 38,8 km. Esse é mais um efeito positivo da entrada da iniciativa privada no setor rodoviário.

Para a distribuição dos novos radares, o DER se orientou por um levantamento feito entre 2005 e 2011, que identificou 500 pontos considerados críticos nas 114 rodovias do Estado. Serão beneficiadas as regiões de Campinas, Itapetininga, Bauru, Araraquara, Cubatão, Taubaté, Assis, Ribeirão Preto, Araçatuba, Presidente Prudente, Rio Claro e Barretos. Além disso, algumas cidades cortadas por rodovias tomam a iniciativa de pedir a instalação de lombadas eletrônicas em suas proximidades. É o caso, por exemplo, de Mogi das Cruzes, servida pela Rodovia Professor Alfredo Rolim de Moura (SP-88), onde se registraram 64 acidentes com três mortes nos primeiros quatro meses deste ano.

Foram registradas 7 mil mortes em acidentes de trânsito no Estado, no ano passado, segundo o superintendente do DER, Clodoaldo Pelissioni, das quais mais de 2 mil nas rodovias estaduais. A causa de um grande número desses acidentes foi o excesso de velocidade. Com o maior rigor na fiscalização, espera-se aumentar a segurança nas estradas e reduzir pela metade o número de mortos nesses acidentes até 2020.

Dados do estudo Morte no Trânsito - Tragédia Rodoviária, feito pelo SOS Estradas, comprovam o acerto da decisão do governo paulista de apertar a fiscalização nas estradas. Ocorrem em média 723 acidentes por dia nas rodovias pavimentadas do País, que deixam 35 mortos e 417 feridos, dos quais 30 morrem de sequelas dos acidentes. A maior parte das mortes no trânsito ocorre nas estradas, embora o número de acidentes nelas seja menor. Mas eles são muito mais violentos, por causa da maior velocidade, e por isso provocam número mais elevado de mortos e de feridos graves do que os das cidades. Morrem 42 mil pessoas por ano em acidentes de trânsito no Brasil, das quais 24 mil nas estradas.

Outro dado importante: 90% dos acidentes nas rodovias são provocados por falhas humanas. Daí a importância da fiscalização, tanto do excesso de velocidade como do consumo de álcool, e de campanhas de educação dos motoristas. Neste caso, o fato de São Paulo ter as melhores rodovias não ajuda. Ele exige ainda maior rigor na fiscalização, porque isso facilita o abuso da velocidade.

sábado, 1 de junho de 2013

DETRAN CRIARÁ DIVISÃO PARA CASSAR CNH

ZERO HORA - 01 de junho de 2013 | N° 17450

MOTORISTA INFRATOR

Presente no Código de Trânsito Brasileiro há 15 anos, punição levará dois meses para vigorar no RS



O Departamento Estadual de Trânsito (Detran-RS) criará até o final de julho uma divisão específica para tratar da suspensão e da cassação da carteira de motoristas infratores. De acordo com o presidente do órgão, Leonardo Kauer, a medida se fez necessária para contemplar a demanda que será gerada com a implementação do projeto para cassação de habilitações. A penalidade está prevista no artigo 263 de Código de Trânsito Brasileiro, mas, passados 15 anos desde a sua entrada em vigor, ainda não é aplicada no país.

ORio Grande do Sul será pioneiro no cumprimento da regra, informa Kauer. A estimativa é que, de imediato, cerca de 4 mil gaúchos possam perder o direito de dirigir por dois anos. Desenvolvido pela Companhia de Processamento de Dados do Estado (Procergs), o sistema informatizado, que permite o cruzamento de dados, segue em fase de testes e deverá estar em pleno funcionamento dentro de dois meses.

Desde abril, cinco processos de cassação foram instaurados de forma experimental, mas apenas um motorista entregou a habilitação. Os outros ingressaram com recursos. O presidente do Detran culpa a burocracia pela não aplicação da penalidade até agora, e informa que a Associação Nacional dos Detrans trabalha para alterar a legislação, na tentativa de reduzir as possibilidades de recursos.

– Se ninguém fez até agora (colocar em prática a cassação), é porque é um negócio difícil. A legislação nos impõe tantas travas e amarras que gera esta sensação de impunidade. Estamos em um processo aqui que nenhum outro Detran tenta porque está olhando para um muro – afirma Kauer.

O descompasso de ritmo também é verificado no caso das suspensões. Em 2012, foram abertos 32.155 novos processos, sendo que apenas 13.376 motoristas entregaram suas habilitações, incluindo os remanescentes de anos anteriores.

Novo departamento do órgão funcionará com 16 pessoas

Inicialmente, a equipe da divisão de suspensão e cassação – penalidades que hoje são tratadas dentro da Divisão de Infrações – será composta por 16 pessoas, com meta de chegar a 20. Para isso, é preciso que o concurso que abrirá 216 novas vagas saia do papel, o que deve ocorrer até o final do ano. A estrutura irá operar na Rua dos Andradas, no centro da Capital. O órgão hoje tem cerca de 600 servidores.

Conforme o Detran, a cassação do direito de dirigir pode ocorrer quando o condutor suspenso ou condenado judicialmente por delito de trânsito for flagrado dirigindo ou em caso de reincidência de infrações consideradas gravíssimas. Entre elas, estão dirigir embriagado, entregar direção à pessoa não habilitada, realizar manobra perigosa em via pública e dirigir um veículo diferente da categoria consentida na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) ou na Permissão para Dirigir.

Apesar de ainda não saber quanto tempo levará para um motorista ter a carteira cassada, parece certo que será um processo longo. Somente o caminho até a suspensão da CNH pode levar, em média, até um ano e meio – quando o motorista esgota as chances de recurso.

CLEIDI PEREIRA


ENTREVISTA

“Fiscalização está cada vez mais atuante”


JOÃO FORTINI ALBANO

Professor de Transportes da Escola de Engenharia da UFRGS, João Fortini Albano defende que penas mais rigorosas – como a cassação de habilitações – podem resultar na diminuição do número de acidentes.

Zero Hora – De que forma a cassação da CNH pode contribuir para um trânsito mais seguro?

João Fortini Albano – Ações desta natureza, como fiscalização e multa, são muito positivas e têm resultado a curtíssimo prazo. A maioria das pessoas que são penalizadas para de transgredir depois que recebe essa primeira ação mais enérgica. Com medidas mais duras, por medo de multa ou de não poder mais dirigir, o usuário vai começar a tomar uma atitude de respeito à legislação do trânsito e, por consequência, colaborar para a segurança do sistema, diminuindo o número de acidentes.

ZH – Por que o Estado demorou tanto para implementar esta penalidade prevista no Código de Trânsito Brasileiro, que em setembro fará 16 anos?

Albano – Acredito que o Detran estava desestruturado e, agora, procura retomar o que deixou de fazer em anos anteriores, assumindo seu verdadeiro papel. Com isso, passa a ser um órgão mais efetivo e atuante no combate ao número tão elevado de acidentes.

ZH – A medida não corre o risco de se tornar ineficaz, tendo em vista a fragilidade no processo de fiscalização?

Albano – O que observo é que a fiscalização também está cada vez mais atuante. Se o condutor se aventurar a dirigir sem habilitação, ele está correndo um altíssimo risco de, ao ser flagrado, tomar punições ainda mais severas.

ZH – A imprudência é a principal causa das mortes no trânsito. Como mudar esse cenário?

Albano – Esse kit imprudência, que responde por 90% destas mortes, é constituído por desatenção na condução do veículo, excesso de velocidade e embriaguez ao volante. A ação mais importante para combater o excesso de acidentes é a fiscalização severa, preventiva e punitiva. As ações de educação são importantes, mas para resultados mais a longo prazo.