sexta-feira, 25 de abril de 2014

LIVRES PARA DIRIGIR


ZERO HORA 25 de abril de 2014 | N° 17774


ARTIGOS


Rosane Schotgues Levenfus*




Dirijo há exatos 32 anos. Na minha faixa etária, devo revalidar a carteira de motorista a cada cinco anos. Aconteceu agora, foi simples e rápido. Paguei R$ 166,72. Realizei foto, assinatura e impressões digitais. O exame médico durou menos de cinco minutos. Sentei e li algumas letras demonstrando que minha visão alcança cerca de cinco metros de distância. Reconheci quatro cores: amarelo, vermelho, verde e azul, provando que não virei daltônica da noite para o dia. Respondi negativamente à pergunta se cometi algum acidente com vítima e fui liberada. Simples assim!

Eu podia ficar feliz com minha performance nesse exame ou em não ter perdido meu tempo. Mas confesso que saí amargurada. Entrei no Portal do Trânsito em busca de pesquisas e o que encontrei de mais recente foi que o Brasil está na 10ª colocação, entre 99 países, em taxa de óbitos por acidentes de transporte. Também encontrei que a morte de jovens cresceu mais de 30% em 10 anos. Outra pesquisa confirma que, com o passar dos anos, o tempo de reação a ações na direção aumenta e idosos chegam a demorar 40% mais do que jovens no tempo para frear o carro. Um dado importantíssimo diz respeito à atenção: 62% das batidas são causadas por distração.

Assim, nesse exame de aptidão física e mental, conforme regimenta o Denatran, eu deveria ter sido examinada no humor, atenção, orientação, memória, controle de impulsos, indícios de uso de substâncias psicoativas, perturbações da percepção. Além disso, o médico deveria ter realizado avaliação otorrinolaringológica, cardiorrespiratória e neurológica. Deveria ter observado aparelho locomotor, presença de cicatrizes e não apenas avaliação oftalmológica. É claro que nada disso aconteceu nessa avaliação a jato.

É óbvio que esse descaso também está relacionado a essa posição linda que nosso país ocupa no ranking dos maiorais em acidentes no trânsito. Pelo menos, na avaliação psicológica, algo está para acontecer. A partir de fevereiro de 2015, só poderá se cadastrar psicólogo perito examinador de trânsito aquele que tiver concluído curso de especialização validado pelo Conselho Federal de Psicologia, que exige formação de 500 horas. Muita gente vai reclamar quando as reprovações nos exames começarem a acontecer. É de se esperar, já que poucos compreendem os problemas que têm e os riscos que correm. Uma das pesquisas aponta que 26% dos motoristas dirigem embriagados e, desses, quase metade declara acreditar que o álcool não os prejudica na direção.

O que eu espero, sinceramente, é receber a avaliação que mereço e que todos os brasileiros merecem, em minha próxima revalidação. Problemas no trânsito já tem de sobra, mas assistir ao descaso por parte daquele que tem obrigação de prezar pela vida humana, isso ninguém merece.


*PSICÓLOGA

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